Os valores femininos têm um grande impacto em nossas vidas, quando somos crianças reproduzimos em grande parte o que está acontecendo à nossa volta. O aprendizado gerado pelas relações com os nossos pais, irmãos e parentes nos deixa marcar por toda a vida. São nestes primeiros relacionamentos que iniciamos a nossa compreensão do mundo que está por vir.
Sou descendente de uma grande família tipicamente brasileira. Parte materna de espanhóis que chegaram após a Segunda Guerra. Pelo lado paterno tenho no sangue a coragem dos nordestinos que desbravam o interior do Brasil.
Entre a dureza de quem quase nada pode trazer ao Brasil, pois partiu para um novo país apenas com a esperança de recomeçar e a energia de quem queria construir uma história no Sudeste, meu pai e minha mãe se conheceram no Paraná e tiveram quatro filhos homens espalhados pelo Brasil. Um paranaense, dois cariocas e um paulista.
UMA FASE DE PEQUENAS CONQUISTAS
Em boa parte da minha primeira infância eu apenas existia. Sobrevivia com meus pais que nada deixavam faltar de essencial e lutávamos pelas pequenas vitórias. Uma nova blusa ou mesmo um chocolate ou refrigerante era para eu e meus irmãos um belo motivo de alegria.
Minha família sempre foi marcada pela força do masculino, os homens sempre foram os “cabeças” de quase tudo. A mulher cabia o domínio próprio da dona de casa, minha mãe como única mulher de cinco homens (meu pai e meus irmãos), cuidava de tudo e de todos sem ter o seu valor reconhecido.
Como é complicado romper este ciclo quando nascemos nele e somos forjados por ele. Demorei tempo para entender que não era esse masculino que eu me identificava. Sempre questionei a ausência da opinião da minha mãe nas decisões, a ausência dos valores femininos. Acabei muitas vezes me rendendo a discussão, pois ela própria não queria todo o barulho sobre o tema que eu provocava.
REPRODUZIMOS O QUE VIVEMOS: ROMPER CICLOS CAUSA DOR E DESCONFORTO
Os anos se passaram e desde muito cedo, digo isso, pois com cerca de onze anos eu já estava envolvido com quase tudo que era permitido a mim. De movimentos dentro da Igreja Católica a organizações dentro da escola eu já era o líder ou mesmo provocador de ações.
Durante a minha adolescência pude ter um contato melhor com o mundo exterior e as experiências começaram a fazer uma grande diferença na minha vida. Neste primeiro momento, pude começar a perceber que não seria a masculinidade do macho alfa que facilitaria minha vida, mas sim alguns valores femininos que eu havia aprendido com minha mãe.
Confesso que não foi o momento mais fácil da minha vida. Na adolescência, temos muito o que decidir, como: o que fazer após o ensino médio, como começar a gerar alguma renda, enfim tenho hoje quarenta e quatro anos e em minha juventude muito era cobrado de nós.
Lembro como se fosse hoje, um grupo de jovens que eu liderava dentro da Igreja quando pedi que uma das minhas amigas estivesse comigo na liderança do grupo e juntos começamos a pensar em novas ações não apenas com meu ponto de vista, mas respeitando como ela via e sentia o grupo.
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ESCUTA, COMPAIXÃO, PERDÃO E DOAÇÃO DE AMOR: OS VALORES FEMININOS COMO CENTRO DA VIDA DO HOMEM
Quando começamos este movimento em que quase que diariamente falávamos sobre os grupos que liderávamos e expressamente eu queria ouvir a opinião dela e como ela via tudo que estávamos vivendo, comecei a ser despertado para uma possibilidade totalmente nova.
Sou homem, crescido em um lar apenas com irmãos. Pai referência de poder e força. Bem, não fui apresentado ao universo feminino como hoje tenho consciência que compreendo. Custa caro aos homens viver atualmente dentro de uma bolha achando que a sua testosterona é a melhor forma de resolver os conflitos diários aos quais somos submetidos.
Escutar é sem dúvida o maior desafio que eu tive. Sócrates em uma das suas andanças pela Grécia ensinando, disse que apenas quem faz a pergunta correta compreende a situação ou ainda o fato em si.
Quando perguntamos o que realmente importa, abrimos um caminho para o outro responder. Quando perguntamos, precisamos estar preparados para ouvir. A escuta é um dos melhores traços dos valores femininos. Minha mãe e a minha querida amiga de liderança juvenil, muito me ensinaram sobre o ouvir.
A PRIMEIRA LIÇÃO EM BUSCA DO MEU LADO FEMININO
Aprendi com elas que ouvir de forma interessada faz toda a diferença não apenas na compreensão do tema em questão, mas na atenção mesmo que estamos depositando no outro com quem estamos nos relacionando.
Escutar, portanto, foi uma das primeiras lições que aprendi nesta jornada em busca do meu lado feminino. Tenho consciência que nem sempre tive compaixão comigo mesmo durante esse processo. Fui duro e impaciente, como era possível eu não ter percebido que deveria ter dado mais atenção à todas as mulheres que já havia conhecido.
Aos poucos fui percebendo que não era o que eu havia vivido que me definiria, mas minha capacidade de aprender com o que eu estava percebendo. E quando entendi que poderia ser hoje alguém melhor, comecei a entender que compaixão é quando não apenas nos importamos verdadeiramente com o sofrimento do outro, mas como compreendemos que nós mesmos podemos ser protagonistas de mudanças agindo no agora e superando o que já sofremos.
QUANDO PRATICAMOS O PERDÃO VERDADEIRO ELEVAMOS A NOSSA HUMANIDADE
Neste caminho em busca do meu feminino, precisei inúmeras vezes pedir perdão a inúmeras mulheres que tive contato ao longo dos anos. Nas relações de trabalho a busca tem sido sempre ouvir a opinião do outro, partilhar a tomada de decisão e imputar no dia a dia os conceitos relativos a este feminino.
Escutar sempre, perguntar com inteligência, antes de pensar algo ou construir juízo. Olhar com o coração para a situação, ter compaixão e praticar o perdão quando necessário.
Gosto de pensar no perdão como superação, jamais como esquecimento de algo que foi feito a você. Perdoar acaba sendo a minha libertação e não a do outro. Quando perdoo, compreendo, elaboro e continuo minha jornada construindo meu caminho.
O desafio não está em perdoar. O desafiante é libertar o seu sentimento do juízo feito e voltar a acreditar que é possível amar.
Aquela amiga da juventude, ensinou a mim a mais importante das lições. Quando verdadeiramente partilhamos sem preconceitos as oportunidades que temos, as decisões, as alegrias e tristezas, esvaziamos nosso ego e libertamos a nossa essência.
O que estou dizendo é que vejo hoje um número enorme de homens sofrendo por não compreender seu feminino. Eles, porém, quando descobrem que podem doar amor sem que isso represente uma perda do seu masculino entram em uma nova fase e crescem enquanto seres humanos conhecendo cada vez mais os valores femininos.
VALORES FEMININOS: APRENDER A OUVIR MAIS E MAIS
Escutar nunca foi forte em nós, pois estávamos sempre envolvidos em falar. Expressar nossos sentimentos é algo novo para nós. Afinal, vivemos a nossa própria ditadura moral na qual aprendemos que nem chorar podíamos.
Tudo isso é muito novo para nós, mas confesso, como é bom não ter o peso da resposta para tudo quando na verdade construir um caminho no qual mais pessoas possam estar é muito gratificante.
Por outro lado, é preciso a abertura sincera a opinião para criar um caminho com o diálogo, prática da compaixão e a vivência do perdão, para que assim possam estar sempre presentes sem que isso seja uma coisa nova, mas sim uma nova maneira de viver.
O caminho se faz ao caminhar, não existe nada fácil. Mas hoje posso realmente dizer, sou muito mais feliz por ser quem sou. Alguém que constrói pontes, refaz caminhos, mas sempre ouvindo quem está ao meu lado.
Viver é transformar vidas. Transformando a minha, posso ser um agente de doação de amor. Afinal, é isso que o mundo precisa.
SOBRE O AUTOR
Benício Filho
Formado em eletrônica, graduado em Teologia pela PUC-SP, com MBA pela FGV em Gestão Estratégica e Econômica de Negócios, pós-graduado em Vendas pelo Instituto Venda Mais, Mestrando pela Universidade Metodista de São Paulo na área de Educação e pós-graduado em Psicanálise pelo Instituto Kadmon de Psicanálise.
Atualmente está em processo de conclusão do curso de bacharelado em Filosofia pela universidade Salesiana Dom Bosco. Atua no mercado de tecnologia desde 1998. Fundador do Grupo Ravel de Tecnologia, Cofundador da Palestras & Conteúdo, sócio da Core Angels (Fundo de Investimento Internacional para Startups), sócio-fundador da Agência Incandescente, sócio-fundador do Conexão Europa e da Atlantic Hub (Empresa de Internacionalização de Negócios em Portugal), atua também como Mentor e Investidor Anjo de inúmeras Startups (onde possui cerca de 30 Startups em seu Portfólio).
Além de participar de programas de aceleração, como SEBRAE Capital Empreendedor, SEBRAE Like a Boss, Inovativa (Governo Federal) entre outros. Palestrando desde 2016 sobre temas, como: Cultura de Inovação, Cultura de Startups, Liderança, Empreendedorismo, Vendas, Espiritualidade e Essência. Já esteve presente em mais de 230 eventos (número atualizado em dezembro de 2020). É conselheiro do ITESCS (Instituto de Tecnologia de São Caetano do Sul), bem como em outras empresas e associações. Lançou em dezembro de 2019 o seu primeiro livro “Vidas Ressignificadas” e em dezembro de 2020 “Do Caos ao Recomeço”.